quarta-feira, 23 de março de 2011

Natureza Descomposta

Eu nasci eivado em solidão

Composto pela matéria alva do individual

Procurando em meio a olhos

A ridícula companhia da vida


Eu me encontrei no aperto confortável do peito

Na doença leve da alma

E na suave natureza solitária que aceitei ser minha


A ponta dos meus dedos é gelada

Sem nenhuma pretensão de tocar outra pele

Com pouca intenção de reformar a mim mesmo

Nem mesmo de fraturar a solidão alheia


Eu sou o que sou

De natureza individual

Sem companhia suficiente

Sem outro ser humano correspondente


Assim eu pensava

Mas não mais assim vejo


Vejo agora o aparecimento de doenças antigas

Seguindo de forma cogente a lei da cura

Troquei instintivamente

A suavidade da solidão

Pela dureza amável da companhia

Mas e minha natureza?

Onde fica?

Não era eu o homem auto-suficiente?

Não era eu o que independia do próximo?

Não era eu aquele que negava a fraternidade da minha natureza?

Não era eu aquele que investigava o âmago alheio

Com olhos de besouro e compaixão de lobo?

Que olhava o outro como uma peça de um estratagema lógico?


Não há sentido nisso tudo


Me recompus enquanto ser humano

Mas me indaguei o dilema de minha natureza

Como poderia eu ser um ser fraterno?

Como poderia eu ser companheiro?

Como poderia eu ter companhia?

Eu me conhecia pela solidão inveterada

E, na doçura do amadurecimento,

Me vi assim

E vi assim

Que não há natureza que possa me compelir

A ser algo diferente de meus sonhos.

sábado, 19 de março de 2011

Desnublar

Eu tenho passado dias sem um sol no céu

Dias em que as nuvens escondem a beleza celestial

Dias em que o negro do firmamento

Não me permite avaliar a beleza do acima

São dias úmidos e difíceis para a natureza

Dia em que tudo chora

Em que tudo lacrimeja


Eu tenho caminhado por ruas vazias e claras

Em que rostos estranhos e frios tem me chamado a atenção

Eu tenho andado por onde ninguém mais anda

Só as almas perdidas como antes a minha era

Pensam em dar passos largos e velozes

Em direção a um destino desconhecido

Indo de encontro com um objetivo até agora misterioso


Nada disso me importa

Nada disso me aflige nos dias que vivo


Vejo que nada entristeceu

Nenhum céu enegrece a toa

Nenhuma nuvem derrama lágrimas pelo simples ato

Nenhuma física explica o que se passa com a natureza


Tudo, na verdade

É composto por uma física volitiva e passional

Que o céu, as nuvens e o sol

Tem de reverenciar

Uma beleza tão cotidiana

Tão castanha

Tão grandiosa

Tão peculiar


A lógica esvaiu-se do natural


Hoje, as nuvens me cercam por essas ruas

Hoje, o pranto do céu só lava o chão por onde passo

E, hoje, o Sol saiu do céu e caminha a meu lado


É, meu bem

O mundo se rendeu a tua impaciência

A vida rendeu-se aos teus olhos grandes

Para que tu,

Inexplicavelmente

Desse a luz ao meu amor.

sábado, 12 de março de 2011

Inversos poéticos.

                                                                                                                                              Para Paulo Tamer,
                                                                                                                 

Inverso.

De fora...
O cascalho, o casulo, a casca, a capa, a casa, a cara.
Formam.

Mas é a reforma que morfa:
do cascalho, pro verme;
do casulo, pro inseto;
da casca, pro réptil;
da capa, pro herói;
da casa, pra alguém;
da cara, pra ser ninguém;

Estas cascas não são Verso:
- “Poesia é de dentro pra fora, e não o inverso”.

E, pelo Inverso,
sou livre.

Livre pra ser:
-De ninguém, eu mesmo.

(Assim,outra Ilógica).

terça-feira, 1 de março de 2011

Tão

É engraçado como a vida me acontece em etapas, intervalos, de uma forma irreverente e espontânea.

Eu, já tão velho

Eu já tão desgastado pela dureza da vida

Eu já tão reformado em retalhos

Já tão dilacerado por tantas emoções

Nenhuma tão relevante

Nenhuma tão producente

Nenhuma tão nobre


Eu já tão calejado por palavras

Já tão completo pela teoria

Já tão instruído dos males e firmes do amor

Já tão informado das faces duras da dor

Me vejo como nunca me vi

Não me reconhecendo em mim

Com uma dor sem motivo

Com uma ansiedade inebriante


Eu cai e não levantei

Me joguei e não me ergui

Me afundei onde muitos homens não puderam voltar

Me vejo agora dentro do que conhecia apenas em canto

Sou agora a personagem angustiada das minhas histórias

Aquela que se desfigura

Que se refrata

Que se dispõe a ser o que é em sua plenitude

Que se faz transparente e dinâmico

Que se entrega em pura paixão


Agora falo com mais propriedade

Pobres dos homens apaixonados

Fadados a dor confortável da saudade

De se esperar o que não chega na hora que deveria

Que não dá chance ao alivio

Quando a minha rosa se mistura com o feto

E a poesia transpira a dor que vicia

Que não deve cessar

O aperto no peito

O suor na cabeça

As mãos que também transpiram

Em pleno movimento de expectativa

Em plena fantasia de anti-reciprocidade


Eu vejo agora

Porque nas mentes inebriadas que eu descrevo

O mundo deixa de ser suficiente

A solidão deixa de ser companheira ideal

E tudo se torna pouco

O eu é muito pouco

O tu é tão distante

E o nós é o único produto sustentável da vida que agora recomeça.