terça-feira, 1 de março de 2011

Tão

É engraçado como a vida me acontece em etapas, intervalos, de uma forma irreverente e espontânea.

Eu, já tão velho

Eu já tão desgastado pela dureza da vida

Eu já tão reformado em retalhos

Já tão dilacerado por tantas emoções

Nenhuma tão relevante

Nenhuma tão producente

Nenhuma tão nobre


Eu já tão calejado por palavras

Já tão completo pela teoria

Já tão instruído dos males e firmes do amor

Já tão informado das faces duras da dor

Me vejo como nunca me vi

Não me reconhecendo em mim

Com uma dor sem motivo

Com uma ansiedade inebriante


Eu cai e não levantei

Me joguei e não me ergui

Me afundei onde muitos homens não puderam voltar

Me vejo agora dentro do que conhecia apenas em canto

Sou agora a personagem angustiada das minhas histórias

Aquela que se desfigura

Que se refrata

Que se dispõe a ser o que é em sua plenitude

Que se faz transparente e dinâmico

Que se entrega em pura paixão


Agora falo com mais propriedade

Pobres dos homens apaixonados

Fadados a dor confortável da saudade

De se esperar o que não chega na hora que deveria

Que não dá chance ao alivio

Quando a minha rosa se mistura com o feto

E a poesia transpira a dor que vicia

Que não deve cessar

O aperto no peito

O suor na cabeça

As mãos que também transpiram

Em pleno movimento de expectativa

Em plena fantasia de anti-reciprocidade


Eu vejo agora

Porque nas mentes inebriadas que eu descrevo

O mundo deixa de ser suficiente

A solidão deixa de ser companheira ideal

E tudo se torna pouco

O eu é muito pouco

O tu é tão distante

E o nós é o único produto sustentável da vida que agora recomeça.

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