segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Carta a uma menina



Minha querida menina,



Ontem, mais uma vez, vi você passando no caminho de pedras que leva à sua casa. Com jeito de moleca e um tanto distraída, você cantarolava qualquer tatibilapitzum de cabeça baixa e sorriso malicioso. Pensei em te chamar pelo nome, nome que agora conheço e repito insistentemente, como se, a cada vez que o proferisse, os sons desse nome me revelassem alguma coisa nova sobre ti. Mas meus lábios tremeram e já não pude me atrever. Mesmo assim, não posso dizer que não te conheço. Neste pequeno pedaço da tua existência que passou por mim, fiz morada segura e desbravei cada parte do teu rosto, que ficou marcado em minha memória, vindo e me escapando como as ondas que traziam um perfume que agora se espalha por todas as coisas à minha volta.

Aliás, foi só na companhia do mar, que resolvi escrever-te esta carta. Ele me traz palavras, ele me conta histórias, que vão assim sugerindo qualquer coisa que já não pode sair de dentro de mim e que, no entanto, vai se desfazendo em versos que um a um rasgo e dedico às conchas que jamais conhecerei, sentado nessa imensidão de mar e lembrando do teu pequeno corpo que me traz a calma de ser eu, trazendo-me ao mesmo tempo o desespero de não estar contigo. Como uma vez contou-me um velho Pastor, um certo dia Alfeu também se apaixonou por uma bela ninfa. Mas assim como tu foges, e por que vocês sempre fogem, ela também fugia dele sem dó nem piedade. Conta-se que, por desventura, ao chegar à ilha de Ortígia em sua fuga, ela foi transformada em fonte pelo poder dos deuses. Inconformado, como todos os homens apaixonados com a partida sem razão de suas amadas, Alfeu, em desgosto, também se viu transformado num rio do Peloponeso. Mas tão forte era seu amor que, ele mesmo, Alfeu, não mediu esforços para que, uma vez convertido em rio, encontrasse com a fonte da amada pelo mesmo vasto mar que agora tenho à minha frente.

Ah minha ninfa, bela da manhã cujos passos se confundem com o arrebol da alvorada, sê também minha fonte, sê minha água cuja beleza inesgotável dá a força e sentido que preciso para seguir em frente. Não vês que fugindo assim só te rendes mais àquilo que é inevitável? Será que não vês que a beleza de te ver assim eternamente partindo não é maior do que aquela de te ter perdida em meus braços? Que é esse medo senão o medo do próprio salto rumo a tudo aquilo que esperaste com o coração trancado em noites intermináveis de infinita agonia? Dá-me tua mão, vem comigo passear na beira desse mar infinito, nessa tarde branca de olhos esguios que se curva agora para a calma e plenitude do nosso momento. Vem, deixe que eu te cubra com os meus beijos e te abrace assim com toda a força dos desejos meus, só para calar a tua alma e te mostrar que nada são as palavras perto daquilo que sentem dois corpos que se tocam em fogo. Quero a cada beijo como o vento despetalar um a um dos teus medos, deixando que te repouses quieta e risonha nos braços que agora te buscam como quem busca a fonte que corre para o mar em dor. Ah, minha amiga, nunca mais as noites em que tudo se espera e nada acontece, nunca mais essa angústia de não sei o quê, nunca mais a saudade de tudo aquilo que nunca se viveu. Deixa que eu te observe com esses olhos de carinho, que o meu peito bata à vazão dos teus passos e que eu crie em desenhos de giz o teu sorriso no chão. Mas deixa também que te faça sufocar com as minhas mãos sobre o teu corpo, que te veja soltando esses cabelos lisos em minha áspera cama e que te faça suspirar em chamas de amor e de insônia entre beijos e palavras de desejo sem fim. E saiba que se tardam a se encontrar os nossos caminhos, eu em rio e tu em fonte, é porque já nos encontramos nos nossos mais íntimos desejos, na nossa poesia e na nossa esperança da paz inquietante, a paz das convicções e das paixões ardentes.

Esse rio e essa fonte, que de tudo dão a vida, já não podem viver sem saber que um vive e o outro vive. Nos últimos dias, não tens vivido senão para os meus olhares encantados e eu já não vivo senão para contemplar teus passos sem fim de indiferença. Já não é possível que vivas sem mim e que eu viva sem ti e, no entanto, para ti ainda sou como um sonho, ao passo que tu para mim já és antiga realidade. Mas não tenhas medo dos sonhos que respiram, pois estes também não sabem machucar e não provocam a dor de ter que se acordar no meio da noite, triste e sozinha, presa a tudo aquilo a que condena a madrugada.

Não são mais assustadoras as brasas que o vazio, o peito aberto em flor que o nada e o fastio de tantos sentimentos do que a eterna angústia da solidão interminável. Sei que não acabará agora nosso momento, sei que ele permanecerá suspenso e vivo no ar dos pensamentos e, por isso, já não te peço pressa e nem vontade de atropelar os teus receios. Não sei se é verdade que amores serão sempre amáveis, mas há aqueles que estão inscritos com tanta certeza nos olhares dos amantes, que já fazem parte das histórias de suas vidas antes mesmo que aconteçam, aguardando somente o melhor momento para virem à tona. Mas não te disperses no teu medo, não te compares com nenhuma das outras, cujo primeiro vento apagou o fogo que me unia a elas. Tu és a própria chama, o próprio mistério que mantém vivo meu encanto. Só peço que te permitas e que te deixes viver sem medo, nos braços sem fim do amigo que te espera a cada verso, queimando a mão com a brasa que já me consome o peito.


Em mais uma noite de louca espera,


Seu Giovani.


Por David Carneiro, em 21/10/2009

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

A morte e a Vida.

Um dia ela vem e com ela levará todos os nossos prazeres, nossas felicidades, nossas tristezas, nossas peripécias: diante do Absoluto o que era pra ser já foi e não tende a se repetir no desenrolar do tempo fluido, tende a ser esquecido e impronunciável por aqueles que um dia sonharam e sempre hão de sonhar em viver em um lugar melhor, já que somente estes são os que lembram do que já fora escrito na história, e estes mesmos que sempre buscam viver em permanente potência e transcendência. Há fatos e Fatos históricos, os primeiros são marcados pelo esquecimento advindo do Absoluto, os segundos servem para reanimar as almas dos seres históricos, os primeiros animam os prazeres da carne, os segundos agitam e rejuvenescem os seres anímicos valorizando os seus espíritos. Uns se esquecem, outros eternizam-se. Uns se preocupam em não sofrer, outros entendem o sofrimento como a divisão entre Céu e Inferno, os primeiros são maus, os segundos são Bons. E por aí as vicissitudes históricas marcam o constante viver dos homens: ser esquecido ou se tornar eterno? Ser imanente pelos prazeres baixos ou transcender o Absoluto? Ser vil ou ser Bom?

A vileza advém em não se ter respeito pelo intrínseco problema do morrer e da passagem que em muitos é pueril por esta vida. Quem se lembra da obra poética mais vendida em 92? Em se crer mais do que se é, derespeitando todas as possibilidades do tempo, o passado, o presente e o futuro. O nascer, o viver e o morrer. Do sentido histórico da vida, das responsabilidades morais do presente e do que se fazer com o que já vai acabando?

Por que Beethoven quando escutou a música de sua copista chisteou? Porque o que ele criava vinha diretamente de Deus e passaria enquanto houver ser-humano a temporalidade de sua vida. Por que se chora quando se escuta 9ª sinfonia? Porque quando se está preparado o espírito entende os significantes eternos da vida humana entronizadas por esta supra-humana música. Não é questão de ser chata, de ser coisa de metido a intelectual, pedante e outras variantes, é simplesmente a vida espiritualizada ao seu extremo. É o sentir, entender, e transceder os valores materialistas da vida que se vive. É tocar o Absoluto. É sussurrar no ouvido da morte que ela pode ser mais do que comumente se entende: como o fim último e limitante do ser-humano. Quando para Beethoven, na verdade, era exatamente o início da sua eternidade.

O que se falta para existirem outros Beethovens? Colocar em nossas cabecinhas que somos uns joãos-ninguéns, participar do espírito advindo da natureza, respeitar os outros, e, acima de tudo, entender que a morte é só o começo para quem não quer ser esquecido. Que esta vida, no beirar dos 100 anos acaba, e a eternidade é a-temporal. Que os prazeres da carne, enquanto não forem envolvidos pela sublimidade do amor, estão marcados pelo eterno-retorno do sofrimento humano, que daí só pode advir esquecimento, nada mais. Que vivemos numa sociedade marcada por valores mórbidos que só com muito trabalho poder-se-á construi-lá melhor. Um trabalho para a vida inteira, seja na arte, na política ou nas ciências. Algo que possa frutificar o espírito que já vem se esmaecendo desde o início da modernidade. Precisa-se de Vidas dispostas a salvar a humanidade do alvoroço da vida sem sentido e do conseqüente esquecimento pleno. Do materialismo prenhe da perdição do eu, dos valores que embrutecem o que há de mais Divino no humano que é a racionalidade. Somente pelo pensamento correto podemos vivenciar uma experiência digna de sentido, e, somente com isso, podemos marcar o tempo com os nossos nomes.

A cor dos olhos


Estou sentado em uma poltrona de quarto. À meia luz, visita-me inesperadamente a serenidade. Então lembro que estás ali, que és e que respiras, batendo-me então a certeza que “a beleza realmente salvará o mundo”. Para falar a verdade, nunca entendi muito bem essa frase, mas como acredito nela quando sinto a tua calma correndo a casa, quando me apavoro com o teu choro repentino e quando me comovo com cada expressão que nasce do teu rosto. Parece até que os dias da criação se prolongaram só para contemplar a novidade desses teus meses, que agora se apressam trazendo pela primeira vez motivo para o descanso ao sétimo dia.

Agora sei que ficaria de bom grado apreciando os teus olhos por toda a eternidade, só para descobrir se são mesmo cinzas ou se na verdade são de alguma tonalidade desconhecida do azul. E quando esses olinhos, sejam cinzas ou azuis, se fecham só sei que é como um milagre, um pequeno milagre, que me faz experimentar a pari passu as belezas do mundo e do espírito. Mas se choras, ah se choras! Como sinto medo minha pequenina! Talvez na mesma proporção da tua curiosidade por este estranho mundo, que agora se curva em amarelo para os teus primeiros dias. No entanto, preciso te dizer algumas coisas, mas guarda para ti e somente para ti, até porque, no final das contas, minha cara, ninguém sabe mesmo de nada.

A verdade é que vieste ao mundo em um tempo de homens cansados. Homens que cuidam das suas vidas e esquecem-se de dar um sentido a elas, transferindo para cada geração uma farsa de esperança, sem raízes, sem tempo e sem lembranças. Mas não te desesperes, aliás, um pouquinho de desespero nunca fez mal a ninguém. Mas convém lembrar que no meio do vale cinzento e sem graça do medo e da desesperança ainda existem aqueles que transformaram em caminhos as pedras e em força a amargura, talvez para adoçar a boca murcha dos velhos ou apitar-lhes com força as campainhas enferrujadas. Por isso, minha pequenina, há que se fazer barulho, mas não se esqueça que a força de tudo isso reside no silêncio. Lança-te ao mundo, mas não deixe que os teus livros fiquem mofando nas estantes. A serenidade também é importante, mas que Deus não te livre guarde dos devaneios que dão a dor e a graça de se viver. Sê grave, mas não rasgue nunca as tuas poesias por vergonha dos teus sonhos e sentimentos. E, principalmente, não deixe, mas não deixe mesmo que te tirem da tua solidão sem te oferecerem a verdadeira companhia. Palavra de quem já ganhou muitos dias, querendo por tudo perdê-los na solidão.


A cor dos olhos 2

Mas também não quero fazer-te nenhuma profecia. Nem de sábia, nem de astronauta ou bailarina, mas, pensando melhor, acho que uma bailarina não iria nada mal, mas tudo bem. Deixa apenas que eu te veja surgindo, brilhando, sorrindo e também chorando, prometo que não vou mais sentir medo. E se eu sentir, apenas segure a minha mão como fazes hoje por reflexo, até porque acalmar o medo daqueles que amamos também deveria ser um reflexo das gentes grandes, mas isto já é outra história que um dia te contarei se me prometeres ser uma boa menina.

A verdade é que agora que te fito e te tenho nos meus braços fico imaginando o que era o mundo antes de ti e o que serás para o mundo quando já não couberes mais nos meus braços desajeitados. É certo que não crescerás. Verei por várias e várias vezes uma nova mulher surgir dentro de ti e prometo amar a cada uma delas, reservado o meu direito de perder a paciência, reclamar dos atrasos, do mau humor, dos namorados vazios e, principalmente, das bobagens que tão o tom de qualquer beleza feminina.

Também quero que me escutes sempre. Que rias ou preste grave e circunspecta atenção às minhas engenhosidades, utopias ou planos mirabolantes. Que te deleite em risos com as minhas histórias e até que brigues comigo depois que souberes dos meus causos amorosos. Sei muito bem o que vais dizer. Escutarás-me com toda atenção e com uma cara desconfiada, se eu estiver mal, sentirás até pena, mas ao final dirás que eu não presto e que os homens são todos iguais. Mas sei que depois, pensando sozinha, me perdoarás e verás que, no final das contas, sempre tenho um bom motivo para fazer as coisas do jeito que faço. Mesmo assim, prometo não abusar, até porque preciso dar-te um bom exemplo. E é por isso que eu te ensinarei a rezar o “santo anjo”, a fazer sinal da cruz e a fazer promessas para São Francisquinho dos pobres.

Levar-te-ei também para passear e te contarei histórias, nem todas verdadeiras, mas de toda a forma interessantes ou engraçadas, só para que penses no mundo do teu jeito, que aches as tuas próprias respostas e siga teu próprio caminho, mas confesso que não acharei nada mal se em tudo concordares comigo. E depois de tudo isso, como me doerá se nada souberes sobre mim e se a vida me afastar do teu caminho, caminho que vi nascer como quem espera a anunciação do milagre. Darás teus primeiros passos, escreverás as primeiras letras, desabrocharás para os primeiros amores e sonharás com o mundo, eu estando ou não estando contigo. É quando penso que inútil sou eu, que nada sou perto de ti e dessa tua vida que tem o mundo todo pela frente! Não sou e nem serei nada perto do teu infinito, da tua promessa, da tua calma. Mas se deixares e se quiseres, mandarei ladrilhar nos teus caminhos as mais bonitas pedrinhas da poesia e do amor divino. E então, te seguirei distante e encantado com teus passos, desenhando paisagens e personagens no teu caminho. E quando estiveres triste, verás um arco-íris, um pássaro cantador e rio bonito perto de ti, somente para que sorrias e sinta forças para seguir em frente. E então, por um minuto, pensarás que algum anjo te observa, te vela e te livra de todo o mal. Eu não sou esse anjo. Não posso ser esse anjo. Mas rezarei para ele agora e sempre. Amém.


Por David Carneiro, em 9 de Dezembro de 2009.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Candeia, Sobre, Vida e Consolação (trecho)


Candeia

Acenda-te e queima-te vivo, como uma vela
Que calada e muda em parafina sangra
E a todos aquece até o último suspiro de cera
Restando-lhe da fumaça, o cheiro
Que as mãos dispersam em pêndula dança.
Adalberto Sá
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Sobre
"Não há nada mais para ser escrito.
Tudo já foi dito claramente pelos outros.
Porém, o sol é este enigma,
E o amor, este vazio..."
Vitor Nina - Torcicolor - http://www.torcicolor.wordpress.com/

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Vida

A vida é muito mais do que agora,
onde esboças teu receio - é um veio
rodeado de águas idas e vindouras,
e mora no útero mínimo das horas

dilatadas quando oras o evangelo
--x--
Consolação (trecho)
Se estou vivo, vivo
Ainda que na cidade ou pelas ruas,
Eu viva a respirar fumaça
E a comprimir o miocárdio a cada virada de esquina
Renato Torres - A página branca - http://www.apaginabranca.blogspot.com/
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Meu primeiro post,
Uma ode à vida
E uma homenagem
A meus amigos e mestres
Com quem aprendi a escrever
Além do que já está escrito.
Grandes Abraços a todos!
Adalberto Sá








terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Vida

Uma vida inteira.

Ser infinito e assumi-lo.

Hoje não quero sobreviver.

Quero poder.

Poder sentir tudo que uma vida inteira pode dar.

Mas não quero que me deem nada.

Quero uma vida inteira.

Conquistá-la de qualquer maneira.

Para que somente eu possa mandar.

Trazê-la em minhas mãos como um animal selvagem.

Que me morde, morde, morde...

....que me morte!

Vou avançar em cima de ti.

Vou rasgar a tua roupa e te despir.

Vais saber que hoje é dia de selva.

Potência nunca mais.

Quero te golpear.

Oh vida safada!

Quero agir.

Depois quero morrer uma Morte bem sofrida!

Só assim sentirei que estive vivo até o último momento da minha Vida.

...que será também um Início.

por Osíris de Oliveira em 09/12/2009.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Olhos D'água


Se tu sentes, enamorado homem, que os olhos dela nem se umedecem sutilmente em olhar teus olhos já submersos e inundados há muito tempo frente aos dela ainda secos, se sentes isso, lembra-te que água é vida. E teus olhos de contemplação estão sempre molhados. Tem facilidade de se encherem de água. És um olho d’água. Em todo o olho d’água, as águas vem da pedra. E pedra que é pedra, está quase sempre seca, como os olhos dela.


Agora, teus olhos d’água estão encharcados, eu sei. Já transbordam pela tua terra-rosto. Sei também que há sempre uma pedra nova para ser tua fonte. A de agora é das grandes. Dá-te muita água. Para os teus olhos d’água, é a mais bonita, a mais brilhante, estonteante. Para a vida em volta, uma pedra, simples pedra, como as outras pedras.


As águas dos teus olhos d’água são mágicas. Escorrem pela frente deles e os envolvem em liquefaça e fina capa de contemplação sagrada do amor. Teus olhos, tocados por esta água, passam a ver com louvor cada pedaço dessa pedra: a face, os cabelos, os ombros, as mãos, a barriga, o ventre, as pernas, os pés, as unhas pintadas, o batom, o detalhe do detalhe do detalhe do brinco que esta naquela orelha perto do pescoço delicado. A pedra é o supra-sumo da perfeição contemplada vista às lentes d’água que envolvem teus olhos que desejam.


Vais agüentar, olho d’água? Não vais te afogar pelos olhos? Sei que não. No enigmático mundo do rapaz dos olhos da contemplação das pedras - que se enchem de água por elas - nas águas, esses olhos não se afogam e sim respiram. Vivem.


Sabes por que os olhos dela ainda estão secos, caro amigo olho d’água? Palavras tuas calharão em pista: “Talvez porque a tua música meu caro, seja a mesma melodia que sempre embalou os sonhos de amores dessas mulheres ou porque as tuas palavras sempre foram tudo o que elas quiseram ouvir sobre o amor. Só por isso elas não te querem e se arrependem toda a vida por não se permitirem amar”. Foste ao mote da questão. Para a vida desejante desejar, ela tem que sentir falta, estar incompleta.


O que moverá essa pedra-mulher à vida se encontrar um olho d’água eternamente exausto por ela, disposto, capaz de realizar todos os desejos que ela tem? Quando é difícil de entender, da boca escapa: “Ingrata!”.


Resta a ti, olho d’água, tão sensível e cheio, deixar que a pedra tola se sabote em paz. Pois ela conformar-se-á em, futuramente, querer ser fonte d’água abundante a outro olho d’água. Mas esse olho d’água será raso, quase sem água, quase só úmido. A deixará frustrada enquanto pedra-mulher. Ele não vai encher completamente seus próprios olhos d’água em seu louvor. Mas, ao menos a manterá na incompletude, própria de pedra-mulher.


Mas lembra-te, grande amigo, ter um olho d’água que transborda desmedido por cada fonte de pedra nova perene que te toca os olhos, também é uma forma de querer e nunca poder por completo. É também garantir teu infinito desejo. Que sejamos meninos eternamente apaixonados, incompletos e com os olhos cheios d’água.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Benedito Nunes: pensador brasileiro!



Nós do Prosas da Amazônia estaremos todos lá. E, se eu fosse vocês, largaria tudo o que estivesse fazendo para dar uma conferida. A brilhante iniciativa partiu do nosso mestre e amigo Victor Pinheiro, que, apesar da juventude, já está se firmando como uma das grandes referências intelectuais dessa terra. O blog faz questão de destacar na programação o "Curso de Teoria Literária", ministrado pela prof. Jucimara Tarricone (Estácio-SP) e a "Conferência Magna" a ser realizada pelo próprio Benedito Nunes. Até quarta!

domingo, 22 de novembro de 2009

Sentado debaixo do Sol.


Quando chegou o fim da História,
ficamos saudosos da grande Vitória,
Agora tudo é saudade e alucinação na Terra
Estamos flutuando no tempo como um velho e e acabado avião de guerra,
Mas sem piloto, sem passageiro,
só uma estrutura velha,

que voa, nos cortando o céu ligeiro, deixando nossa vida sem reta.

Ficamos em um estado de anestesia total,
cristalizados por cores dissonantes do Real, vivendo pela primeira vez sem espectativa de um final.


Temos saudade agora da Idade Média, como se ela fosse ontem,

E queremos viver como um clássico teatro grego,
escondidos atrás de uma persona de Super-Homem, mas com medo...

Sem continuidade, e sem misericórdia, estamos recortados no tempo-espaço,


Flutuando como um astronauta descalço,
sem passado clarividente.

E enquanto o Futuro nos esperava,
perdemos o caminho de volta pra casa,

E quem um dia me amava,
Hoje, assim como eu, só quer sentar numa cadeira de praia,
com óculos escuros para se proteger do Sol,

Passando um Bronzeador o dia inteiro,

E eu fico lá para ver se alguém belo me seduz,
e continuo até o crepúsculo...

sem pensar em nada...
sem pensar em nada...
Não vivendo,
Não sentindo,
Não conhecendo,
Não sorrindo,

Não sofrendo,
Nem gemendo,

Pois não sinto,

Estou apenas respirando,
e menos que o destino de um pequeno animal

estou fora de qualquer contexto natural.


Descontínuo e recortado.



Não realizando nada..
Somente sentado debaixo do Sol,

Não vendo a minha vida passar.



por Ricardo Evandro Martins em 21/09/2009.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Adeus,Mariá.

Branca e pálida
Lindas coxas
Pôs-se a caminhar
Com suas trouxas.
Cheiro de jasmim
Virgem que da dó
Corre no jardim
Na garganta,um nó.
Mariá,meu bem
Mas porque fugir?
Tudo que quer,tem
Nao há de partir.
Mariá teimosa
Quer um amor
Corre toda prosa
Se abrindo em flor.
Explodindo em luz
Extasiada
Fez sinal da cruz
Chegou na calçada.
Sorrateiro,ali
O rapaz chegou
_ Eu pertenço a ti!
Mariá falou.
Adeus,Mariá
Vai com teu amor
Nada de voltar!
Teu pai acordou.
Adeus,Mariá.
Corre,Mariá.
Segue pra bem longe
Pra não voltar.


Por Marilia Potter,em 17/11/09.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A cidade do João

A cidade do João

Na mesma noite em que o mundo chorou Levi-Strauss
E a cidade perdeu Verequete
Eu perdi o João
João e os direitos humanos
João e os Nós Outros
João e o Haikai
Ivã Karamazov quis pedir o bilhete da vida de volta
Ele não viu nenhuma peça do João
Ele não viu a cidade do João

E agora todos eles dizem que não entendem
Mas eu te entendo perfeitamente meu amigo
Meu querido amigo João. Logo quem?
Tu que já nasceste com pressa para os adeuses
E mais do que todos nós viveste
Porque foste muitos e porque te lançaste nessa vida
Como se teus minutos andassem para trás e pra frente
Com alguma geometria que só tu entenderias

E essa ferida que agora deixaste em nossos peitos
O que é isso João?
Em nada lembra a amarga vida contida no medo
Mas passeia sobre os nossos olhos como os sonhos mais puros
Sonhos que foste em vida e eternizaste com a tua morte.
Tas vendo João? Nos fazes sofrer como quem ensina a cantar
Mas pra que falar da tua morte?
Tu que cantaste a Internationale
Tu que fizeste promessa de fita e cumpriste
Tu que te apaixonaste silenciosamente

Jamais diria isso para tua pobre mãezinha João
Que hoje terá que enterrar o filho querido
Mas sei que não morreste jovem nem morreste cedo
Porque não foste tragado pelos dias
Tu dobraste o próprio tempo, tu foste teu próprio tempo
Tu foste duro João! E duro te vais sem dar satisfação
Como viveste...
Impunemente. Não tens vergonha João?

Hoje passeio solitário pela tua cidade, pela cidade do João
Mês de Outubro já passou, passaram-se os dias de alegria e fé
O amor que vinha não veio
A novidade também não veio
Mas sinto em mim uma estranha força.

Quem viu alguma peça do João Jamais sentiu vontade de pedir
[o bilhete da vida de volta.

David Carneiro
no triste 04 de Novembro de 2009


quarta-feira, 21 de outubro de 2009

BRINCAR DE SER MAU


É, Deus... acontece

Eu sei... desleal

Não sei se se esquece

Não o livraste do mau

Toquinho de gente corria de volta pra casa

Em seus olhinhos diversão

Descalço ao piçarro sorrindo ao chumaço de sol

Prestes a se embrenhar no chão

Chegava ao fim do Jurúnas jurado a um destino

De esfacelar coração


Em nome do pai, um padrasto

De repente pretende brincar

De apagar de uma tarde as cores

Só de dois, um esconde num pátio

Um inocente brincar de gozar

Rogai por nós, pecadores

Agora é a hora de nova morte

Amém!



por Felipe de Campos Ribeiro em 29/09/2009.


sábado, 5 de setembro de 2009






Vida terrena.




E então se fez a Vida...
Das pedras quentes, das águas quentes.
Mesmo que fosse em uma longa Noite fria,
A Inteligência do Acaso aparente, não por acaso nascia.


Um pouco do Nada. Um pouco de Tudo.
Misturando-se com a sabedoria da mais nobre Alquimia,
as magias do Mestre das Magias (e que tudo transforma),
pôde finalmente surgir a Vida.


E as pequenas vidas marítimas se multiplicavam
por uma Seleção contínua. De pequenas e sozinhas.
Cresciam.
Com a mesma força daquela mesma Magia...
Então logo os monstros já diziam: Fome, fome, fome de Vida.

Pisaram na terra.
Voaram.
Presos em uma grande cadeia, a vida expandia e se desenvolvia.
Chegamos a pular em árvores até que chegou o Dia...
...O Dia em que o Sol nasceu diferente.
Nos trouxe ideias reluzentes: lascar, cultivar e fazer fogo pra toda gente.

E logo Andou, Andou, Andou.
Falou e escreveu o que se passava ao redor de sua Mãe querida.
E a este restou a contemplação de toda uma vida...
Mesmo com Saudade de outros dias (de lugares distantes)...
Aceitou o seu caminho. Então seguiu pela Magia.
No cavalo cavalgou. Nas velas velejou.
Andou pelas Rodas da Vida,
até sobrevoar a Muralha da China.
Aprendeu amar a terra e a cultivá-la.

Muitos muros construiu.
Derrubou muitos também.
Muitos se esqueceram da Mãe...
Muitos nunca se esqueceram de dizer Amém.


Esqueceram até do Pai.
Por isso lhe mataram o Filho.
Mas o Mago e sua Magia sempre esteveram lá...
construindo e destruindo...derrubando e trazendo bons ventos...
Nunca julgando, mas sempre agindo
E de sua culpa? Sempre isento...
Desde quando o espaço não era espaço...
Ele se re-vela sempre: O Mago dos Magos..
O Tempo.






Por Ricardo Evandro Santos Martins (Belém -PA, 05/09/2009).

domingo, 30 de agosto de 2009

A Amizade

A Amizade




Havia dois homens
Havia afinidade
Havia dois seres que de tão diferentes
Conversam coisas aparentes
Aparentes para os outros
Mas eternas entrementes
Esses dois se conheciam faz tempo

Porém, cada vez que se encontravam
Parecia que o tempo os aclamavam

Para escutar o que conversavam
Tanto o tempo máquina
Quanto o tempo natural

Não passavam
Diante do momento irreal.






Por Fábio Moura (29/08/2009).






"Prosas da Amazônia XXI" é um blog que propõe o estímulo e a divulgação de prosas, poesias e pensamentos na Amazônia.




Uma literatura nas Amazônias. Ou uma tentativa de produzi-las.




Espero que gostem.




Todos são muito bem-vindos neste espeço virtual.




Abraços.




Belém, 30 de agosto de 2009.




Ricardo Evandro Santos Martins


Foto by Ricardo Evandro. 2009.

sábado, 29 de agosto de 2009


"Prosas da Amazônia XXI" é um blog que propõe o estímulo da produção e da divulgação de prosas, poesias e pensamentos feitos na Amazônia e suas amazônias.


É uma literatura da Amazônia. Da sua urbanidade. E da sua selvageria.


Todos são bem-vindos neste espaço.


Espero que gostem.


Abraços.


Ricardo Evandro Santos Martins.